Para investidores, derretimento do WeWork sinaliza mudança de comportamento do mercado e volta de uma visão mais racional sobre os negócios
Em agosto deste ano, o CEO do SoftBank, Masayoshi Son, dizia que o WeWork seria o próximo Alibaba. Desde então, a empresa perdeu 93% de seu valor de mercado e só não desapareceu porque o SoftBank colocou US$ 8 bilhões no negócio. No futuro, é bem possível que esse seja considerado o ponto de mudança de um paradigma no Vale do Silício: o de que é possível crescer indefinidamente mantendo prejuízos imensos e, mesmo assim, ser muito bem avaliado pelo mercado.
Nesta quinta-feira (07/11), o Web Summit reuniu fundos de investimento para falar sobre o assunto no Center Stage, o palco principal do evento. Um bom exemplo de como é preciso questionar o modus operandi do Vale do Silício está em uma afirmação do moderador Emil Protalinski, editor da VentureBeat: “se você acordar em um colchão da Casper, malhar na Peloton antes do café da manhã, pegar um Uber para o trabalho no WeWork, pedir almoço na Doordash, pegar um Lyft para casa e jantar pelo Postmates, terá interagido com sete empresas que, juntas, terão um prejuízo de quase US$ 14 bilhões neste ano”.
“Estamos começando a viver um momento de reset no mercado, pivotando para o lucro”, afirma Ravi Viswanathan, fundador e gestor da New View Capital. “O caso que o Emil citou é extremo, mas mostra que muitos fundos de capital estão, na realidade, somente subsidiando consumo em negócios que não têm como ter sucesso”, diz Rytis Vitkauskas, sócio da LIghtspeed Venture Partners.
Isso não significa que a ideia de um venture capital colocando dinheiro em um negócio esteja errada. “Optar por crescer rápido mesmo tendo prejuízo é um conceito que gerou algumas das melhores empresas do mundo, mas nem todo mundo é igual. Por isso, é preciso ter muita cautela ao investir a partir desse modelo sem olhar para o modelo de negócios das empresas”, continua Vitkauskas.
Ele exemplifica com o Spotify, que demorou dez anos para ser lucrativo, mas é o maior caso de sucesso em venture capital da Europa. “Às vezes demora para a empresa desenvolver o produto ideal e escalar, e até mesmo para o ecossistema entender o que você faz. Mas quando além disso o modelo de negócios não tem os fundamentos necessários, a startup nunca vai chegar lá”, comenta o executivo.
Para os dois investidores, não se pode perder o foco dos fundamentos dos negócios. “Se você está gastando muito dinheiro para crescer e os clientes continuam voltando, você tem condição de construir um negócio durável. Se eles não retornam, não tem como. É simples assim”, diz Vitkauskas. Para isso, é preciso esquecer o hype e olhar os números. “Se você tem métricas de eficiência que as pessoas usem, como o ROI dos investimentos em marketing, ou medidas de retenção dos clientes, é possível medir o que acontece na empresa e avaliar sua viabilidade ao longo do tempo”, comenta Viswanathan.
Para o gestor da New View Capital, o momento atual mostra que a história é cíclica. “Tivemos no passado outros períodos em que os investidores focaram mais no crescimento a qualquer custo do que no caminho para o lucro. Estamos vendo agora, e o caso do WeWork é emblemático, que há um retorno a uma visão mais racional”, acredita.
Para Vitkauskas, uma das consequências dessa mudança de visão é a maior dificuldade em conseguir grandes financiamentos antes da abertura de capital. “Com o SoftBank, conseguir aportes de US$ 200 milhões, US$ 300 milhões, passou a ser o ‘novo normal’. Acredito que não será mais assim”, diz. “Espero que esse reset do mercado seja permanente e o novo caminho seja de investir melhor, em negócios que tenham um modelo de negócios viável”, completa Viswanathan.